quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Qualquer coincidência não será apenas uma semelhança

Zafira acordara tensa, não sabia bem o motivo, mas  estava ansiosa. Não tinha passado bem a noite, não que estivesse sentindo alguma coisa, mas  sonhara muito, sonhos estranhos envolvendo muita gente de um passado, que se não queria esquecer, também não queria lembrar. Sonhou com o ex sogro e, em consequência, com a velha casa da Fazenda Jaboatão, onde fora recebida, ou melhor, onde teve a sua presença imposta por motivos  imperiosos.
O que estaria acontecendo?  Perguntava-se ao levantar da cama.  Ao seu lado a presença de sempre, que apesar da ausência  do ser, se fazia presente no estar.
Levantou-se e foi vestir a roupa da caminhada: se deu conta de que sempre vestia a mesma roupa, deu risada  e imaginou o pensamento daqueles que sempre a cumprimentavam pela manhã  nas suas andanças pela orla. “Será que esta mulher só tem esta roupa?”  Sorriu, era assim  mesmo, agora ela também se perguntava: `Porra você só tem esta roupa? Era capaz de lavar a blusa e usar exatamente a mesma no outro dia.

Sorrindo desta situação  saiu para andar. Eram apenas 6:00 horas da manhã, gostava de andar neste horário porque o sol era mais ameno, além do mais, menos carros e menos pessoas. Depois das 6:30  o povo se bate  pela passarela da orla  e ela não gostava.
Quando voltou para casa foi molhar a grama, coisa que sempre fazia; aliás, ficou especialista em trabalhos solitários, pois era assim que vivia e quase sempre viveu.
Após molhar as plantas entrou em casa para ver as noticias do jornal, se surpreendeu com as novidades: os deputados fizeram, mais uma vez, uma grande sacanagem, normal para uma câmara que se especializou em corrupção, em falcatruas, em jogos políticos, mas aquela passara do limite, a interferência no judiciário é terrível, querer parar as apurações que  levariam a uma possível condenação da maioria  dos membros do Congresso Nacional ( duas casas legislativas)  é  inadmissível, mas é a meta, foi a meta e será a meta, eles nem disfarçam.  Irritou-se, mas ao mesmo tempo  conscientizou-se que a Justiça será feita sempre, acima de tudo e de todos, pois os membros do judiciário não se intimidarão e  continuarão a fazer  o trabalho  que vêm fazendo.
Seu companheiro estava sentado em frente a si e comenta:  Manoel lançou o livro hoje, mandou uma mensagem aqui para mim.
Como é? O que você falou? 
 Disse que Manoel lançou o livro hoje e disse o título do livro, que ela só entendeu metade, percebeu bem que o lançamento fora feito  pela Amazon.
Feitas as atividades do dia, inclusive a mais atual que tem, que é  arrumar dinheiro  para pagar contas, ela sentou-se e pegou o computador para  comprar o livro de Manoel, afinal, ela fizera parte da estória de vida daquele autor.
Quando estava  em processo de compra  do livro lembrou-se do  sonho que tivera com o ex sogro  e a casa da fazenda Jatobá e pensou :  Será que Manoel  vai falar daquela casa da Fazenda Jatobá? Será que falaria dela, Zafira? Será que se reportaria à vida efêmera e ao grande e fulgaz amor dos dois?  Será??????
“Não se julgue tão importante assim Zafira, você foi apenas mais uma a passar pela vida do Melinho”: possivelmente sem grande importância tendo em vista  o que  acontecera em uma passado que se ela não queria lembrar, jamais poderia esquecer,  afinal daquele passado  havia uma prova inconteste  de que, se não houve um verdadeiro amor, houve uma grande e enorme paixão que fora vivida intensamente a cada dia que a vida oportunizou  aos dois  amantes.
“Será que Melinho tinha lembrado  da cerâmica Zafira? Será que  ele lembrou do quanto  deram risada ao descobrirem que  o lugar onde estavam  abrigados  era coberto com telhas da cerâmica Zafira?” -  Claro que não idiota:  então  uma pessoa como Melinho, que  a abandonara sozinha com a sua dor, com o filho de ambos ainda com seis meses, ia lá se ligar em uma telha da cerâmica Zafira.  Aliás, ela sequer entendia porque se lembrava ainda disto, já se lá iam 43 anos, e ninguém ia guardar um pequeno detalhe deste. Ela se lembrava apenas pela coincidência, que não fora uma mera semelhança, e sim uma realidade,  do nome da cerâmica com  o seu próprio nome. Lembrou-se que comentara na oportunidade: “Não sabia que era dona de uma cerâmica”?
Bom, enquanto não começar a ler o livro não saberia o que nele se contém, então  o melhor era logo acabar com a compra e  esperar o download.
Sim, ali estava ela, Zafira, e a sua “troupe” da qual Melinho passou a fazer parte, e somente, e exclusivamente, por este motivo que os dois se encontraram.  Sim, foi uma paixão arrebatadora. Zafira não conhecera uma paixão assim antes, nem mesmo com o seu mais querido namorado, aquele sim um homem de 1.90m e lindo, tinha sentido uma coisa tão forte.  Por ser forte, foi intensamente vivida por Zafira, que se entregou mesmo de corpo e alma, muito mais de corpo no começo, mas depois a alma se confundiu com o corpo  e ela já não sabia pensar, o seu racional era a carne a carne era o seu espirito. Precisava da carne para ter o espirito em paz, e a carne  tinha um nome: Melinho.  Ele lhe fizera mulher, e como mulher o seu corpo clamava por carinhos, por volúpia, por paixão, o que teve durante algum tempo.
O que Zafira não sabia, entretanto, é que o Sr.  Melinho apenas passava chuvas, não aguentava  tempestades e nem calmarias, sua vida precisava  de ser vivida intensamente não admitia rotinas, precisava pulsar a todo o tempo, a sua alma e o seu corpo precisavam  de impulsos diários, mas impulsos novos, desconhecidos, por muitas vezes perigosos, e Melinho, sem quaisquer pudores, deixou Zafira, abandonando-a como se faz com um animal de “desestimação”.
Nem mesmo um retorno desastroso foi  capaz de aliviar  a dor passada por Zafira, que durante muito tempo  sofreu sozinha a sua dor, dor intensa que a fez quase sucumbir, mas, como o próprio Melinho, um dia lhe escreveu: “ mas você ressurgiu em mais belas e esplendorosas formas”,  ela ressurgiu, lutou,  venceu e  hoje  ela se pergunta mesmo: “Será mesmo que viveu tudo isto? Será que as semelhanças como meras coincidências descritas por Melinho se referem mesmo a si?  Será que a ficção imitou a realidade ou a realidade  foi uma ficção?  Melhor pensar que  tudo não passou mesmo de uma ficção, é assim que vai encarar tudo o quanto  foi exposto ficcionalmente  no livro de Melinho e, no final, agradecer, pois, ao menos  na ficção, reviveu uma grande história de amor que foi imensa e infinita enquanto durou, entretanto ela se perpetuou pois o sangue dos Melo Rego continua  pulsando  no rebento advindo  desta bela, intensa, dolorida para uma das partes, estória de amor.  

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